Na terra de Zumbi, Justiça mantém Ação Penal por “Racismo Reverso”

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racismo reverso não existe

O Tribunal de Justiça de Alagoas negou o pedido do Instituto do Negro de Alagoas (Ineg) para trancar uma ação penal por “racismo reverso”, supostamente cometido por um homem negro contra um italiano residente no Brasil. Dessa forma, em pleno estado que nasceu Zumbi, o judiciário brasileiro pode fazer história da maneira mais desagradável possível.

Decisão Controversa

Em acórdão publicado na última sexta-feira (24), o relator do caso argumentou que “o crime em questão [injúria racial] pode ser cometido contra qualquer pessoa, independentemente da sua cor, raça ou etnia, caracterizando-se por ofender a dignidade de alguém”.

A decisão surpreendeu o Núcleo de Advocacia Racial do Ineg, que considera a interpretação uma grave distorção da lei que deveria coibir o racismo no Brasil. Segundo Pedro Gomes, advogado do Núcleo de Advocacia Racial do Ineg, “a tese de denúncia contra essa pessoa é que uma pessoa branca, europeia, pode sofrer racismo em razão da sua condição de branco europeu. Isso é o que torna o caso tão esdrúxulo”.

Contexto Legal

O Artigo 20-C da Lei nº 14.532/2023 estabelece que o juiz deve considerar como discriminatória qualquer atitude ou tratamento que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida a pessoas ou grupos minoritários, com base em sua cor, etnia, religião ou procedência. “A lei vem para proteger as pessoas que são comumente vítimas de crimes raciais, no caso pessoas negras, indígenas”, ressaltou Gomes.

Para o advogado, permitir a ação penal abre um precedente perigoso, pois a lei é destinada a proteger minorias sociais que são tratadas de forma desigual. “Quando se usa essa lei para mais uma vez mostrar o poder de uma pessoa branca sobre uma pessoa negra, retira-se todo o contexto pelo qual a lei foi feita e se utiliza como mais um elemento de opressão contra as pessoas negras”, argumentou Gomes.

Falta de Provas

O Instituto do Negro de Alagoas também destaca a falta de provas robustas para o prosseguimento da ação penal, que é baseada apenas em um print de uma conversa de WhatsApp, não legitimada por ata notarial.

Entenda o Caso

Em janeiro deste ano, o Ministério Público de Alagoas apresentou denúncia de injúria racial contra um homem negro, com base na queixa-crime de um italiano que afirmou ter tido sua “dignidade, decoro e reputação” ofendidos devido à sua “raça europeia”. Na denúncia, a advogada do italiano alegou que “as ofensas proferidas pelo querelado denegriram a imagem e ofenderam a honra subjetiva” de seu cliente.

A Justiça alagoana acatou a denúncia, tornando réu o homem negro que supostamente disse ao italiano: “essa sua cabeça europeia, branca, escravagista não te deixa enxergar nada além de você mesmo”. De acordo com o Ineg, o homem negro havia sido lesado pelo europeu em uma transação de compra de terreno e também tinha uma relação trabalhista com ele.

Ao utilizar a lei para punir um homem negro por suposto racismo contra um homem branco de origem europeia, a ação legitima a ideia de “racismo reverso”, o que, na avaliação do instituto, é uma verdadeira aberração jurídica. Diante disso, o Ineg estuda levar o caso para análise no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A decisão do Tribunal de Justiça de Alagoas abre um debate importante sobre a aplicação das leis antirracismo no Brasil e os limites da interpretação jurídica. O caso levanta questões cruciais sobre a proteção legal destinada a minorias e a possível distorção dessas normas quando aplicadas fora do contexto para o qual foram criadas.

 

Foto: Reprodução/X

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