O Brasil é um país marcado pela desigualdade racial, que se reflete em diversos aspectos da vida social, econômica e política. Um dos mais graves e visíveis é a violência policial, que atinge de forma desproporcional e sistemática a população negra. Um estudo recente, divulgado nesta quinta-feira (16), revela que, em 2022, 65,7% das pessoas mortas pela polícia em apenas oito estados brasileiros eram negras. Se considerados apenas aqueles com cor/raça informada, esse percentual sobe para 87,4%.
O estudo, intitulado Pele Alvo: a Bala não Erra o Negro, foi realizado pela Rede de Observatórios da Segurança, do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), e se baseou em dados fornecidos pelas polícias do Rio de Janeiro, de São Paulo, da Bahia, de Pernambuco e do Ceará, Piauí, Maranhão e Pará, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). O levantamento mostra que, no ano passado, 4.219 pessoas foram mortas pela polícia nesses estados, sendo 2.700 negras.
Os números evidenciam o racismo estrutural que permeia as instituições de segurança pública no Brasil, que tratam os negros como suspeitos e inimigos, e não como cidadãos com direitos. Em todos os estados analisados, a proporção de negros mortos pela polícia é maior do que a de negros na população, segundo dados do Instituto Brasileiro e Geografia e Estatística (IBGE). A diferença é mais acentuada na Bahia, onde 94,8% dos mortos com cor/raça informada eram negros, enquanto os negros representam 80,8% da população total do estado.
A Bahia também foi o estado mais letal em 2022, com 1.465 mortes provocadas pela polícia, superando o Rio de Janeiro, que registrou 1.330 óbitos. Em seguida, aparecem Pernambuco, com 631 mortes, e São Paulo, com 581. O estudo aponta que há uma falta de políticas públicas efetivas para reduzir a letalidade policial e garantir o respeito aos direitos humanos, especialmente dos negros, que são as principais vítimas da violência estatal.
Além disso, o estudo denuncia a falta de transparência e de padronização dos dados sobre as mortes provocadas pela polícia nos estados. Dos oito estados pesquisados, apenas o Maranhão não informou a cor/raça de nenhum dos mortos. Já no Ceará e no Pará, mais da metade dos mortos não teve a cor/raça identificada. Essa omissão dificulta o diagnóstico e o enfrentamento do problema, e revela o descaso e a indiferença com a vida dos negros no Brasil.
O coordenador do CESeC, Pablo Nunes, afirma que “os negros são a grande parcela dos mortos pelos policiais. Quando se comparam essas cifras com o perfil da população, vê-se que tem muito mais negros entre os mortos pela polícia do que existe na população. Esse fator é facilmente explicado pelo racismo estrutural e pela anuência que a sociedade tem em relação à violência que é praticada contra o povo negro”.
A pesquisadora da Rede de Observatórios, Silvia Ramos, destaca que a quarta edição do estudo demonstra o crescente nível da letalidade policial contra pessoas negras. “Em quatro anos de estudo, mais uma vez, o número de negros mortos pela violência policial representa a imensa maioria. E a constância desse número, ano a ano, ressalta a estrutura violenta e racista na atuação desses agentes de segurança nos estados, sem apontar qualquer perspectiva de real mudança de cenário”.
O estudo Pele Alvo: a Bala não Erra o Negro é um alerta para a sociedade brasileira sobre a urgência de combater o racismo e a violência policial, que ceifam milhares de vidas negras todos os anos. É preciso exigir transparência, responsabilização e controle das ações policiais, bem como investir em políticas de prevenção, mediação e resolução pacífica de conflitos. Somente assim, o Brasil poderá se tornar um país mais justo, democrático e seguro para todos.